segunda-feira, 1 de novembro de 2010

MADONA DE FOUCAULT



MÃE, EU TENHO MEDO.
MEDO DOS OUTROS, DE MIM, DO MUNDO.
MEDO DE TUDO DE FORA E DE DENTRO... E DAS DOBRAS...
MÃE, QUERO A BARRA DO SEU SAIOTE, SUAS PREGAS, SUAS RENDAS, SUAS RUGAS, SUAS RUSGAS, O FORRO:
PARA ESCONDER-ME DAQUILO QUE NEM SEI SE SOU,
DAQUILO QUE NEM SEI SE QUERO,
DAQUILO QUE ME COAGE, ME DASAFIA, ME ESPERA...
DAQUILO QUE INVENTO...
MÃE, EU NUNCA FUI AUTÔNOMO,
PRECISO DE SUA SOMBRA, SEUS BRAÇOS, RODAS, BÚSSULA E ELMO...
MÃE, JÁ SOU BARBADO, MAS É SÓ UMA MÁSCARA,
NÃO MAIS QUE UMA CARRANCA PARA ESPANTAR OS MEUS FANTASMAS,
(OU MONSTROS QUE CRIO E RECRIO, EM MEU LABORATÓRIO LÚDICO, COMPULSIVAMENTE PARA MEU EGO)
MÃE, JUSTIFICA OS MEUS TIQUES, POIS NÃO PASSAM DE AMULETOS, MULETAS...
FORMAS DE OBJETIVAÇÃO DE UMA CORAGEM NÃO SUBJETIVA...
MÃE, TENHO TODOS OS DOCUMENTOS, MAS NÃO TENHO IDENTIDADE,
NEM SEI SE PRECISO DE UMA TENDO VOCÊ...
OU TANTAS TEIAS DE SABERES E PODERES DIFUSOS...
MÃE, TENHO FALO FANTOCHE E FALA ESTÉRIL...
MÃE, QUE EXISTÊNCIA RIDÍCULA,
COM PERSONAGENS FELIZES NUMA COISIFICAÇÃO ABISSAL.
MÃE, CRIASTE UM IDIOTA, CUJO ID, TÃO CHEIO DE SI E CEGO DE CONSCIÊNCIA, É CASTRADO DE VONTADES, INCONSCIENTE, ÉBRIO E PERTURBADO POR CAMINHOS AÉREOS... ROTAS ALADAS...
FEITO ALELUIA QUE, NUM GOZO PRECOCE, PERDE SUAS ASAS E DESCOBRE QUE, NO CHÃO, SÓ PODE GUIAR-SE PELO RABO DE OUTRAS, DESGRAÇADAS E DESALADAS COMO ELA...
MÃE, POR QUE FIZESTE DO MEU CORDÃO UMBILICAL UMA FORCA?
SÃO DOBRAS DOLOROSAS DE MEMÓRIA E ESQUECIMENTO,
COEXTENSIVOS E VIVOS NO TEMPO DO LADO DE FORA...
INFINITOS E INVISÍVEIS SE NÃO OS CONTORÇO PARA O LADO DE DENTRO, MAIS PROFUNDO E DE MODO VISCERAL, COMO CARNE...
EM TROVÕES E RELÂMPAGOS, FALAR E VER, LINGUAGEM E LUZ...
DOS RAROS MOMENTOS, MÃE, QUE ME DEIXASTE SER.
MÃE, TANTAS MÃES, QUANTAS MÃES PRECISO PRA ACHAR QUE VIVO?
MÃES QUE ME MATAM DE MORTES DIFERENTES TODOS OS DIAS.

Um comentário:

  1. Hiparquia, você tem me surpreendido a cada texto. Estou esperando o próximo da "menina e a mosca". Parabéns e boa sorte.

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