sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Tsunami

Death & Mathew
Gerson Watanuki

10:00 - Estou no trabalho cumprindo horas extras... Estou muito triste. Se queria me decepcionar, conseguiu. Eu não estou chateada só porque não foi e nem me avisou com antecedência, também não só porque o estacionamento estava vazio, o prédio escuro e, tirando o pessoal da limpeza e internos, só tinha eu sentada em frente a sua sala por 30 minutos, esperando por um milagre... Fiquei aborrecida por não ter sido avisada... tinha evitado que eu viesse "falando" o caminho todos sozinha com você até chegar ao consultório, com muito cuidado para não deixar que as coisas mais importantes evaporassem antes que pudessem chegar aos seus ouvidos... Fiquei esperando em vão... desconcertada... mas você disse que viria... mesmo que os outros não viessem... por isso não pude falar tudo que havia preparado no meu caldeirão... - Não pude te falar do quanto essa semana foi pesada para mim; - Não pude te falar do quanto estou para explodir a qualquer hora... em qualquer lugar... com qualquer um... como fazem as cadelas; - Não pude te falar o quanto culpo o Totem por ter me abandonado, não cuidando de mim, não cumprindo seu papel de controlar tudo aquilo que não quero que aflore como um EU descontrolado... me deixando solta para o Universo que eu não queria voltar a ser... e ainda de maneira mais agressiva; - Não pude te falar do meu ressentimento pelo quanto me dediquei a esse relacionamento com a ocupação quase que filantrópica, uma terapia ocupacional, e não tive o pagamento ou resultado esperado... acredito ser melhor do que um não alguém... preciso de "falar" tudo o que deixou de ouvir... Que sensação horrível. Uma dor quase insuportável (dói, dói muito, eu não consigo chorar... uma pressão que sufoca a voz e a visão... Foi assim até subir de volta ao estacionamento... sempre olhando para as pessoas dos carros que vinham, como se pudesse vê-lo chegando atrasado... numa angústia de justificar o que havia acontecido, amenizar minha dor, a sua ação (apenas um atraso é melhor que o esquecimento) Quando cheguei no carro o choro veio, infantil, estava protegida pelos vidros fechados para ninguém escutar os soluços, os gemidos, os grunhidos, o descontrole das tempestades de verão... Estou muito triste... e se choro é porque eu esperava que você... como bom ouvidor... tivesse um interesse maior pelo que passo... além de um simples protocolo... estágio... projeto... com tempo determinado para começar e terminar... Sei que não devia ter invadido seu espaço, já havíamos combinado assim,,, não quero fazer nenhuma besteira maior do que minha própria existência... Precisava abastecer mas não conseguia parar de chorar para estacionar em algum posto... segui até o trabalho, parei no estacionamento e tentei refazer meus olhos ardendo em brasa... Perdoe-me ter entrado, mas eu precisava muito... Não precisa continuar se não quiser... se não precisar mais de mim... mas que seja logo... abandonos repetidos ...não estou preparada. Eu só queria que me ouvisse. Eu te avisei do feriado. Mas confirmou... disse que viríamos... Enfim... Fiquei com o choro e com muitas idéias na cabeça que não puderam se esvaziar em você... se eu explodir... se eu não suportar... se for pesado demais...
Obs 1: 11:30 ao ligar em casa, recebi o recado, estou esperando... Obs 2: 22:16 coloquei o celular para carregar a bateria e recebi seu segundo recado... Obs 3: mas mesmo assim resolvi mandar o recado, para você me ajudar a entender porque sou tão dramática, tão visceral... que de lúcida não tenho nem a máscara...

2 comentários:

  1. Se tudo isso for verdade, ou ainda que apenas uma pequena parte, eu é que não queria estar na pele desse analista.
    Analistas não são deuses com respostas, são apenas profissionais, como um encanador que chega, conserta uma válvula hidráulica, recebe e vai, sem maiores intimidades, encanadores não ligam depois para saber sobre o serviço prestado.
    Encanadores bonitões, viris, insaciáveis, e dispostos a saciar, existem apenas em enredos de filmes pornô.
    O resto, cara Aletheia... bem, o resto é o que chamam de realidade.

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  2. Realidade, verdade... essas expressões não dizem respeito nem a anônimos, nem a poetas conhecidos, nem a crônicas em blogs... tudo é um drama criado para reforçar o exagero dos olhares diversos sobre as coisas "existentes" nos diversos espaços ... criamos tudo e todos de acordo com nosso apetite... conveniência... dolentia...
    Na maioria das vezes autoimunes...

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